
Por Pedro Paulo Rosa
Foto: Pedro Paulo Rosa
Revisão Textual: Paulo Cappelli
No monólogo de estreia de Caco Ciocler, podemos perceber, logo de início, várias nuances de um ator maduro que domina muito bem o palco. Em 45 minutos, obra teatral escrita pelo dramaturgo Marcelo Pedreira e com direção, cenografia e iluminação de Roberto Alvim, estamos diante do desespero, da incerteza e dos questionamentos de um ator desesperado, tentando expressar para a plateia, a qual ele deveria “monotonamente” entreter, que não vai entretê-la.
Ao passo que as trocas entre ele e a platéia fluem, o texto vai tomando uma dimensão incomensurável e a identificação das pessoas é imediata, pois as questões que o personagem único – sobre um palco sem roteiro e com pouca luz – suscita e questiona não é só voltada para profissionais ou pensadores do teatro, mas também tocam questões como as nossas atitudes e escolhas na construção do mundo. Tanto no campo pessoal, quanto no coletivo.
Com duração de exatos 45 minutos, a peça parece passar – inicialmente – depressa, embora mais adiante fiquemos tão mergulhados às confissões, perguntas e reclamações deste ator, sob nenhum suporte, e em cena aberta. Este envolvimento se dá porque nos identificamos com ele. A profundidade do texto é traduzida por uma atuação provocativa, visceral e espontânea de Caco.
Após o ensaio, ele cedeu entrevista ao Hélio, confira:
O Hélio: Do que se trata a peça?
Caco Ciocler: Esta peça provoca a platéia em sua posição e postura em relação a arte! Trata, também, de questionamentos do ator e de quem pensa teatro. Na verdade, a gente ri da própria desgraça. Estamos mesmo num período entre safras.
O Hélio: Há uma crítica, então, ao entretenimento?
Caco: Exato. Estamos num momento pós-humano. Já passou aquele tempo em que íamos ao teatro para vermos coisas cotidianas e nas quais a gente se reconhecia. O objetivo é perguntar ao público se ele quer mesmo só o entretenimento, enfim, levantar perguntas, e reflexões.
O Hélio: Você começou no teatro?
Caco: Sim. Fiz 15 anos de teatro amador, em São Paulo e a Escola de Arte Dramática (EAD), da USP.
O Hélio: Como entrou na Rede Globo?
Caco: Em 1995, estava com dois espetáculos infanto-juvenis e, inesperadamente, recebi um telefonema do Luiz Fernando Carvalho (Diretor), me convidando para um teste. O tempo passou, eu passei no teste. Meu papel foi o Jeremias Berdinazzi. Fiz o Raul Cortez jovem, primeira fase da novela “O Rei do Gado”.
O Hélio: 45 minutos é o seu primeiro monólogo? Que desafio é esse?
Caco: O desafio vai começar agora! (Risos). Na verdade, o que percebo é que o monólogo traz uma responsabilidade muito grande. Se eu entrar com uma onda errada no palco, não vou ter um parceiro de cena para me salvar. No monólogo, a gente não pode perder o público em nenhum instante.
O Hélio: O quê o público pode esperar de “45 minutos”?
Caco: O público pode esperar uma nova "experiência" teatral. Ou, um stand up comedy às avessas. (Risos).
A peça estréia no Rio de Janeiro no dia 1º de Abril, no Teatro SESI; fica por três meses e depois ruma para o Centro Cultural São Paulo. 45 minutos é um espetáculo forte, firme e que não foge das imperfeições, não tenta responder a todas as perguntas nem solucionar a dor ontológica que todos nós, mesmo com tantos séculos de ciências e filosofias, ainda sentimos. Na peça, as perguntas são a chave para uma sensata reflexão. Este dilema é comum a todos nós, inclusive a Caco Ciocler, a Marcelo Pedreira e ao Roberto Alvim.

O Hélio: Marcelo, conta um pouco como surgiu este texto?
Marcelo Pedreira: Eu passava por uma crise em 2004 sobre esta questão da Arte X Entretenimento.
O Hélio: Por quê?
Marcelo: Está tudo tão misturado. E esta mistura angustia também o ator que pensa o fazer teatral. Nós já passamos por tantas correntes artísticas, tantas escolas literárias, o que mais temos a dizer? Será mesmo que ainda temos ou a semente que gera a arte é outra?
“Mas, um dia todas as vozes se calam... até as mais brilhantes”. (trecho do texto de Marcelo Pedreira)
O Hélio: É outra?
Marcelo: Sim. O teatro precisa se indagar, a arte não pode estar obrigada a entreter, nem tampouco condicionada à burocracia mecânica dos projetos (editais). Hoje em dia, se faz primeiro o projeto para depois pensar a arte! Temos de tomar cuidado com este automatismo, ele pode sucumbir muitas coisas lindas do fazer artístico e do ser ator.
O Hélio: E as novelas...?
Marcelo: Ah, novela hoje é sobrevivência.
Chega o Diretor, com semblante atarefado e de correria. Peço uns minutos e ele senta à minha frente. Roberto Alvim, autor da famosa e original peça “Tríptico” (considerada a melhor peça de São Paulo do ano pela Folha de SP e pelo Estadão) é um diretor atípico. E isso é lindo de se ver. Além de conduzir uma equipe com muita harmonia, Roberto ousa na sua iluminação que é a grande movimentadora deste espetáculo, pois dá cadência cênica e o personagem, ainda que fuja da luz para as sombras do canto do palco, embala a platéia junto com ele. Alvim, com a sua originalidade, soube dirigir o ator com muita abertura. Fica claro o quanto o diálogo é aberto e produtivo entre autor, diretor e ator.
“O nosso viés, a nossa escolha, nosso caminho, é pensar se o encontro que o teatro propõe pode acontecer em outras bases que não sejam do entretenimento infantilizado e viciado, automático” (Roberto Alvim)
Formado pela CAL (Casa de Artes de Laranjeiras), fez também cinema na UFF e mestrado em História do Teatro pela UNIRIO. Foi diretor do Teatro carioca Carlos Gomes e neste espaço teve uma oficina, a qual se traduzia no projeto Nova Dramaturgia Brasileira; lançou muitos nomes de autores dramaturgos contemporâneos, como Pedro Brício e Marcelo Pedreira. Em 2006, Roberto vai para São Paulo e lá possui um teatro chamado Club Noir (localizado à Rua Augusta, 331).
Polivalente e simultâneo, Alvim está com uma peça estreada no dia 17 de março (2011) em São Paulo, chamada “Pinóquio”. Ele afirma que a peça nada tem a ver com o conto do Walt Disney. Sumariza 45 minutos como a “ anti-anti-peça”, uma vez que é uma linguagem que almeja outro tipo de troca entre ator-plateia e arte-teatro.
O Hélio: Qual é o viés da peça?
Roberto Alvim: É um outro viés. Certamente, não é o do entretenimento. Negamos o teatro convencional que se faz no momento.
O Hélio: Explique.
Roberto: O nosso viés, a nossa escolha, nosso caminho, é pensar se o encontro que o teatro propõe pode acontecer em outras bases que não sejam do entretenimento infantilizador e viciado, automático.
Marcelo Pedreira entra novamente no papo, acrescentando:
--- Mesmo com tanta filosofia, não tivemos um verdadeiro conforto espiritual. A dor de todo mundo ainda está aí, e é vivida por todos nós. Ainda não chegou nada para quebrar esta lógica de séculos e séculos.
O Hélio: É como ser um estrangeiro de si mesmo e do redor?
Marcelo: Sim.
45 minutos é uma obra inesquecível e que aborda, inclusive, a força universal da coincidência, da matemática e do acaso. Saímos da peça inebriados com a brilhante atuação de Caco Ciocler; e cheios de disposição para a vida. E com empatia pelo personagem, que antes parecia tão amargo, mas que depois se torna tão familiar a nosso âmago mais íntimo.

Roberto Alvim, Caco Ciocler e Marcelo Pedreira
Evento: Peça “45 minutos”
Temporada: 1º de Abril a 26 de Junho de 2011
Local: Teatro SESI – Rua Graça Aranha, 1. – Centro - RJ. Contato: (21) 3344-5500
Horário: Quinta a Domingo, 19 h 30 min.
Valor: R$ 40, 00 (inteira) ; R$ 20,00 (meia)
Marcação de grupo (com 48 horas de antecedência): (21) 2563-4163
Email do Teatro SESI: teatro.sesi@firjan.org.br
Site do espetáculo: WWW.45minutos.com.br
Agradecimentos:
Mariana Campos (Cinema Nosso)
Miriam Juvino (Diretora de Produção do espetáculo)